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sábado, 6 de agosto de 2011

Capítulo 11


O casamento

   Botina com o solado furado, quase sem estudos, sem profissão, com trinta e um anos resolvi me casar.  Não tinha nada, havia vendido minhas últimas 13 novilhas, mas resolvi fazer uma casa, comprei u lote que antes era um campinho de futebol, do Sr. Eliseu que havia ficado responsável para vender para o Sr. Lamartine.    
   Agora eu precisava de tijolos, espalhei a notícia eu pagava por tijolos... Quando eu chegava do serviço à meninada estava cada um com seus montões, meio tijolo, tijolo inteiro... Cada um tinha seu preço... Fui assim comprando tijolos, até que o Lázaro meu irmão apelou e me deu 500 tijolinhos.
  Assim comecei minha primeira casa, lá na colina, como dizia a pastora Orsila.  Perto de casar ganhei a madeira do Sr. Cármino Silva (Seu Balico), eu e meu pai tiramos a madeira e cascamos, o irmão João Nunes lavrou as  vigotas a machado, e o José do tio Vergílio me deu a serração das torinhas e ganhei do Sr. Antônio Jorge todas as portas e janelas. Reboquei a casa já descalço, eu não podia comprar lonas novas... Mas estava feliz e o povo já podia ver a casa do Pedão. Fui almoçar na minha mãe e na volta para a construção em frente a casa do Sr. José Batainha encontrei um par de botina mateirona, estava furada no solado mas eu peguei assim mesmo... 
  Chegando à construção a lavei bem e pus em cima da varanda, mais tarde os irmãos José Justino e Itamar foram me visitar e eu mais do que depressa pedi:
__Zé você vai arrumar minha botina e é de graça!
 Ele pegou uma delas deu uma olhada e disse:
__  Ah irmão Pedro ta muito ruim não tem conserto não...
__ Tem – insisti – você põe uma palmilha por dentro e uma meia sola bruta por fora, ela vai ficar nova...
   Assim ele fez, ficou bem pregada, e caprichoso como é, passou uma graxa e ela ficou nova!  E não cobrou nada...
  Comecei então a trabalhar de botina!  Nossa casa era a maior e mais bonita da rua, alpendre, sala, cozinha, dois quartos, banheiro, e área com cisterna dentro e girau... Fiz um fogão caipira e reboquei tudo e passei cal rosado, virou uma tetéia, piso de tijolos rejuntados portas e janelas marrons, ficou nos trinques... Por fora tijolo, por dentro adobe que o Antônio Caetano me ajudou a fazer. 
  Não tinha energia, mas tinha lamparina...  Depois de pronta a cabana comprei os móveis, peguei um carrinho de uma roda só feito de madeira e fui à casa do meu pai e peguei minha cama com colchão e tudo e levei para minha casa.  Minha mãe perguntou:
__ O que é isso Pedro?
__ Tô mudando, se eu não casar fico por lá mesmo... e toquei o carro pra casa.
  No culto à noite levei uma das chaves da casa e passei para a Sônia e disse a ela:
__Amanhã vou trabalhar você vai com sua mãe lá em casa e olha bem tudo o que eu tenho se te serve,tudo o que tenho está tudo ali, nada mais...
  No outro dia fui trabalhar pensando o dia inteiro no que ia acontecer...  A tarde cheguei do serviço e quando abri a porta, vi a casa toda arrumada, ela havia limpado e forrado tudo, confesso que chorei... E pensei: é agora vou casar mesmo.
  Quando fui pedir o casamento levei a Bíblia debaixo de um braço e um 38 debaixo do outro braço, se o pai dela não deixar eu dou um tiro nele e fujo com ela.  Meu sogro não queria o casamento já que o meu nome não era bom na cidade... Mas ele apenas coçou a cabeça e disse:
__ Eu não queria não e você sabe, mas já que ta danado mesmo vocês casam... Mas não é para a Orsila mandar na sua casa!
__ Nem ela e nem o Senhor lá em casa mando eu!
  Nos casamos sobre a proteção de Deus pelo Pastor José Marcelino, o irmão Joãozinho (João Ribeiro) foi quem levou minha noiva ao altar e sua esposa quem arrumou a noiva, roupas e tudo.


  Casamos.  Que maravilha, eu e ela na nossa casinha, Quando entramos na nossa casa após o casamento ajoelhamos juntos e fizemos uma oração para Deus nos abençoar...
   Na primeira noite só havia um travesseiro o eu que havia trazido da casa da minha mãe.  No outro dia ela perguntou:
__ Pedro cadê os cabides para eu por a minha roupa no guarda-roupa?
  Comecei a chorar eu havia casado pobre demais nem tinha cabide! Passei a mão num facão e arame e fui fazer os cabides, e eles estão lá em casa até hoje junto com os novos, para sempre lembrarmos do quanto Deus já fez por nós.
 Bem no outro dia Sônia pegou um travesseiro emprestado da mãe dela.  No terceiro dia passei na loja do irmão João Ribeiro para comprar a prazo quatro capas para travesseiro e falei pra ela:
__Va lá na casa da sua mãe e faça quatro capas para travesseiro que eu vou buscar as painas no brejo.  Fui ao Brejo da Cerâmica e apanhei as buxas das taboas, desfiamos e fizemos travesseiros fofinhos e cheirosos. Na terceira noite já tínhamos travesseiros de sobra.  Como Deus é bom!
  Que maravilha era mais um lar para as senhoras da igreja visitar e orar, mas começou uma certa conversação e eu fiquei  sabendo, cortei um pedaço de papel e escrevi: “Aqui na minha casa não aceito fuxico”. Preguei na porta da sala com quatro pregos.
 Eu trabalhava como pedreiro, lavrador de dormente, e picador de lenha para a Cerâmica Cumari, trabalhava apenas cinco dias na semana.  No sábado era dia de jejuar.  Eu ia cedo ao açougue do Sr. Antônio Jorge, comprava meio quilo de carne moída, passava na Padaria do Sr. João do Hilário comprava quatro pães banana.  Em casa a Sônia fazia a carne, punha uma pimentinha, cebola, rachava os pães colocava a carne, fazia um litro de suco e juntos subíamos para o Morro da Mesa, íamos juntos orar e entregar o jejum ao meio dia.  Cada vez que íamos levantávamos uma pedra como testemunha de que estivemos lá...

Morro da  Mesa- Cumari Go
Uma das passagens bíblicas lidas por nós no Morro da Mesa

 
Morro da  Mesa - Cumari Goiás




  De lá íamos ao Ribeirão Pirapitinga com duas varas de anzol para pescarmos bagre lambari, timburé..., dois estilingues para matar inhambu... Tomávamos banho no Poço do Pé de Jambo, eu a balançava no cipó...

Ribeirão Pirapitinga
              

  Um pé de jambo doce não me sai da memória, enchíamos a capanga com suas frutas e demais frutas do mato: gabiroba, pitanga, pequi, mangaba, guapeva, marmelada preta, ingá, araticum, maria-preta, cajuzinho, pau-doce, melancia de tatu, mutambo,entre tantas frutas do campo e do cerrado... E vínhamos comendo no caminho, na tapera dos Naves tinha caju roxo... quanta gostosura...
Até hoje não esquecemos daqueles momentos simples, mas tão preciosos... chegávamos em casa cansados, mas felizes...
  No domingo irmã Maria Ribeiro mandava um de seus filhos levar para nós dois bifões acebolados já prontos que delícia! Deus provém! Éramos tão pobres, mas agradecidos a Deus à tarde o irmão José Recorde que era nosso vizinho, saía a porta da casa batia na barriga e dizia:
__Ei irmão Pedro, graças a Deus comi quiabo até estufar a barriga...
   E a noite lá ia ele com sua guitarra e eu com o meu violão louvar ao Senhor na igreja...

Nosso primeiro fogão a gás
   Bicicleta naquele tempo era artigo de luxo, e eu fiquei sabendo que perto de Catalão na Fazenda Quijila tinha uma para vender, da marca Sieger, importada.  Peguei uma bicicleta emprestada com meu irmão Lazim e fui até lá.   Comprei-a por mil e oitocentos cruzeiros e empurrei as duas bicicletas até Cumari cerca de uns 25 quilômetros...  Cheguei satisfeito, a lavei, remendei os pneus e no outro dia cedo fui buscar a carne e o pão para irmos para o Morro da mesa para orar.
   Quando estava passando na porta do Delfininho Lourenço (meu primo) ele me ofereceu um catira, ele ia mudar para Goiânia e tinha um fogão a gás novo com botijão pela metade e disse vamos trocar.
   Fizemos o negócio eu arrumei o Joaquim Fabiano com a carroça para levar até em casa.  Cheguei a pé e logo Joaquim apareceu e foi descendo o fogão, Sônia perguntou:
__ De quem é esse fogão?
__ È nosso – respondi
  Pusemos o fogão na cozinha ela até requebrava, parecia que nós havíamos ficado ricos afinal quase ninguém tinha fogão a gás na cidade, mas ficamos com medo de incendiar o fogão.

Nosso Primeiro Filho: Haroldo
  A vida parecia um paraíso, mas logo veio a luta a Sônia engravidou e fomos preparar o enxoval que alegria! Vai chamar Haroldo! Mas a Sônia levou um tombo e o bêbê virou, ficou atravessado, e o parto se antecipou, o bêbê era grande e a Sônia muito pequena, e eu não tinha dinheiro para levar minha Sônia para o Hospital em Goiandira para fazer uma cesárea.  O parto foi difícil e nós perdemos o nosso tão esperado filho.  Ainda hoje depois de 39 anos é difícil falar nisso... Lembrar de ver o nosso filho sendo levado para o cemitério... Como dói... Adeus Haroldinho... Minha Sônia quase morreu também e eu decidi: Não quero mais filhos! Doamos todo o enxoval e procuramos mais não falar no assunto... Guardando uma dor só nossa.
   Sônia queria voltar a estudar e eu não queria, tinha medo de que ela virasse as idéias. Mas minha mãe me convenceu e o meu irmão João de Deus emprestou o dinheiro para a matrícula dela.



Eu e minha mãe

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