Ficando valente
Subimos na Serra do Mané Gomes após uma pescaria mal sucedida no Córrego Gengibre começamos a rolar pedras para cima da lavoura dos japoneses, o Senhor Nego Pifaino e Batista estavam desterroando e gritaram:
__ Oh, não jogue pedra aqui não!
__ Vá a p... – respondemos de pronto!
O boi quebrou o canzil e o seu Nego pegou o facão para cortar um pau para substituir o que havia quebrado, mas nós pensamos que ele vinha nos atacar e Braz disse:
__Aí vem ele e agora?
__ Ta no tiro – falei - segure aqui as varas, escanhotei o cão da espingarda e disse: __Pode vir vou fazer de vocês uma peneira!
__ Não, não, eu vou é fazer um canzil – disse o sr. Nego.
__Então volta pra trás - disse Braz – senão nós te torra mesmo.
Ele voltou e nós fomos embora.
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Espingarda |
Virando Homens!
Meu pai tinha um carro com oito bois que cantava que era uma beleza, e aos 12 anos pedi ao conhecido Sr. Joaquim preto para fazer um carrinho igual ao do meu pai, ele fez o carro, Sr. Sebastião o ferreiro, ferrou com pregos tipo meia laranja de carro grande, e então quando ficou pronto meu pai ia à frente com o carro grande e eu atrás com o meu carrinho: quatro bezerros mansinhos, todos admiravam eu e meu pai carreando juntos. Os bezerros cresceram e eu os vendi com o carrinho e para o Euclides (Ocrídio) e comprei vacas leiteiras.
Por volta dos 13 anos meu pai adoeceu e eu fui carrear agora com o carro grande: oito bois, canga do cabeçalho feita de Jacarandá, a canga era tão pesada que eu tinha que por de um lado para abrochar, e depois punha do outro lado, mas os bois do pai eram bem mansos.
Com a doença de nosso pai (coluna), Braz e eu tivemos que virar homens, éramos doze pessoas para alimentar, resolvemos então plantar uma roça de milho e arroz e sem noção plantamos demais, colhemos uns 30 jacás só de milho de pipoca, comemos, doamos para muita gente, vendemos, jogamos para os porcos no mangueiro e o milho não acabava... Minha mãe gostava de fava patacão e Braz e eu, fizemos duas lavouras grandes de milho e plantamos fava no meio e virou uma mata, meu pai quase morreu de raiva, pois não dava para capinar nem colher direito o milho por causa das favas virou uma latada: colhemos 14 sacas em apenas uma das lavouras, na outra o gado entrou e comeu toda fava mas deixou o milho, mas nós ficamos com raiva pois queríamos vender todas as favas para São Paulo, para fazerem plástico... Enjoamos de fava e passamos a cozinhá-las para os porcos.
Meu pai sarou e continuamos a trabalhar juntos, mas queríamos mudar para a cidade de Cumari, meu pai alugou uma casa por seis meses, e quando venceu o aluguel, ele vendeu quatro bois carreiros e comprou uma casa. Mas o carro era grande e ficaram apenas quatro bois e precisávamos trabalhar. Então o Sr. Adolfo Pereira foi a Formosa e trouxe 70 curraleiros, e eu comprei seis bois pretos mascarados e fomos amansar os bichos de chifre longos... Meu pai era experiente e logo conseguimos deixá-los mansinhos.
Meu pai vendia lenha em Cumari para o consumo doméstico dos antigos fogões a lenha, e um dia íamos levando um carro de lenha para o Sr. João Cruz e quando voltávamos para o sítio vínhamos conversando dentro do carro estrada afora, ia tudo muito bem. De repente o Sr. Herculano estava fazendo um aceiro para o Sr. Lamartine na beira da estrada, saiu da moita bem em frente ao carro e disse:
__ Urias, você tem fogo aí pra eu acender o pito (cigarro de palha)?
Os bois se assustaram e saíram em disparada, o pai caiu e eu também,ficou para trás o carote de água, machado, caldeirão de comida esparramou, mais na frente ficou as rodas do carro com o eixo, quebrou os fueiros, os bois pararam na beira de uma cerca, os curraleiros debaixo da mesa do carro e os bois de guia ficou com as cangas cruzadas com os do cabeçalho...Meu pai só dizia:
__Seja tudo pelo amor de Deus!
Nós conduzimos os laços no carro e amarramos os bois de novo, um ficou solto, meu pai o laçou e cangou de novo e fomos embora eu na frente com uma vara e pai do outro lado com outra vara e o Sr. Herculano (o que nos ensinou a tocar cavaquinho) correu, pois meu pai queria ir dar uma surra nele.
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Essa foto é muito linda só faltou meu pai e eu aí em cima... quantas saudades... |
Discutindo com o pai
Um dia brigamos, pai e eu, estávamos trabalhando e tombamos um carro cheio de milho e ele ficou nervoso quando eu não consegui fazer a força necessária que ele precisava, e veio me dar uma varada com a vara de ferrão, e eu levantei a minha vara e disse:
__Vem, o Senhor não vai me bater mais, eu já tenho quinze anos!
Ele parou e disse:__ Criei cobra para me morder, seja tudo pelo Amor de Deus.
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Esse não sou eu, mas era assim que trabalhávamos! |
Não me bateu, em silêncio arrumamos o carro e o milho, não ficamos inimigos, mas na noite em que o Senhor Jesus o levou, depois de muitos anos, antes de partir ele se lembrou do fato e me pediu perdão.
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